terça-feira, 17 de agosto de 2010

Privatização da Educação Pública - Parte II


Achei importante abrir este segundo momento da discussão sobre a privatização das verbas da Educação pública a partir dos comentários feitos pelos colegas de luta Luciano e Denise. Em seguida farei um comentário adicional. Então vamos aos textos:

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" Euler, aqui em Janaúba como deve ocorrer em outras cidades uma escola particular está recebendo dinheiro do Estado para ministrar cursos técnicos sendo que no horário noturno muitas salas das escolas públicas estão ociosas. Se o governo tem que investir em cursos técnicos por qual motivo isso não é realizado na escola pública? Será que fica mais barato para o Estado essa prática de pagar para a escola privada do que ministrar os cursos nas escolas públicas?

Luciano - professor de História"


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"Luciano,

Com certeza fica muito mais barato, sem falar na economia que o governo de Minas fará com os encargos trabalhistas.

O PEP - Programa de Educação Profissional - tem em seu escopo algo positivo, tal como: cursos voltados para as necessidades do mercado de trabalho; e as instituições conveniadas (selecionadas através de licitação) tem que obedecer certos padrões de qualidade tanto de estrutura fisica como de pessoal.

Infelizmente, tem cursos que demandam laboratórios, visitas técnicas e trabalho de campo, sem falar no profissional especializado. E assim...

Qual professor com especialização e tal irá trabalhar no serviço público para ganhar um salário como é pago hoje e para piorar sem nenhum benefício agregado?

Na unidade escolar que eu trabalho, nossos alunos não dispõem de quadra para atividades de educação fisica. A professora trabalha na base do improviso.

Nem tem laboratório de ciências, o laboratório de informática acabou de ser montado nste mês, com 08 máquinas ligadas à internet rural.

Este número de máquinas para atender aproximadamente a 780 alunos divididos em dois turnos; e nem sabemos quando a escola irá de fato atender aos alunos, uma vez que a escola não possui profissional para orientar os alunos e nem o governo autoriza a designação.

O certo é que os nossos alunos necessitam terminar o ensino médio com uma profissão para enfrentar o mercado de trabalho. Eu dúvido que o modelo utilizado hoje para oferecer a educação profissional seja abandonado devido a vantagem econômica para o caixa do governo.

O perverso deste processo, é que ele é seletivo, poucas vagas, dependendo do curso o aluno poderá ser encaminhado para instituições distantes o que onera em muito o orçamento doméstico devido ao alto custo do nosso transporte urbano.

Particulamente, acredito que eles poderiam melhorar este programa a partir das correções apontadas acima.

Abraços,

Denise"

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Colegas de combate Denise e Luciano:

Inicialmente, um abraço. Agradeço aos dois por terem tocado em assuntos tão relevantes e ter dado esta oportunidade de diálogo sobre tais assuntos. O depoimento que vocês nos trazem revela em parte o descaso com a Educação pública em Minas e no Brasil, na modalidade ensino básico. A utilização de espaços públicos por interesses privados é um aspecto a destacar. A própria rede estadual deveria incentivar a formação de profissionais ou realizar concurso para preencher os cargos com profissionais de áreas técnicas para suprir essa demanda.

Além disso, esse problema não pode ser visto sob a ótica do que é mais econômico para o estado, mas, sim, daquilo que é o melhor para a comunidade. Se o estado aparelha adequadamente as escolas e nomeia profissionais capacitados poderá oferecer vagas de forma ampla nas escolas públicas. Do contrário, o que acaba acontecendo? O estado terceiriza mão-de-obra, inclusive pagando salários mais altos do que aquele pago aos profissionais concursados da rede pública; aluga máquinas e galpões e seleciona um pequeno número de estudantes que será direcionado para o mercado de trabalho.

Em última instância, esta prática contraria a política de inclusão, e cria uma seleção dentro da escola pública que, de acordo com a lei federal deve ser inclusiva, aberta para todos/todas e de qualidade. Há vários projetos dessa natureza realizados pelo estado, como: a "escola referência", e outros, sempre preterindo a maioria e selecionando algumas poucas escolas ou alunos.

De uma certa forma, infelizmente, esta prática é feita também pelo governo federal, através do MEC, que ao invés de formular uma política de valorização dos profissionais do ensino básico - o que custa mais investimento para a União, estados e municípios - preferiu investir nos CEFETs, que são escolas técnicas federais de qualidade, mas não conseguem atender a toda a demanda existente. Assim, uma minoria da população estuda nos CEFETs, enquanto a grande maioria da população estuda em escolas públicas com profissionais mal remunerados, pouco aparelhadas (laboratório com 08 computadores, como descreve a Denise - é brincadeira uma coisa dessas!!!), sem laboratórios e políticas de formação continuada para os profissionais.

Finalmente, é preciso desconstruir a visão de que o estado deve preparar jovens para o mercado de trabalho. Errado. A Educação pública deve preparar a juventude para a vida, enquanto pessoas pensantes, capazes de criticar e mudar o mundo e não enquanto mão-de-obra para abastecer um mercado de trabalho que muda a cada instante - e é voltado para os lucros privados de alguns. Não sou contra os cursos profissionalizantes na rede pública, mas acho que eles devem ser realizados juntamente com uma rica formação humanística, para não criarmos jovens robotizados, incapazes de pensar além dos limites de meia dúzia de gírias e de modismos.

É sintomático que o governo de Minas tenha determinado que a direção das escolas possa optar por disciplinas exatas ou humanas no ensino médio, uma excluindo a outra, fazendo com que, em algumas turmas, não haja mais aulas de História ou de Geografia. Para mim isso é uma prática inconstitucional, pois contraria a LDB e os preceitos básicos de uma formação ampla, universal e humanista previstos na Constituição Federal.

Tudo isso está ligado a uma lógica de mercado neoliberal, que traz para o ensino público práticas e mecanismos que são usados por empresas particulares para obtenção de resultados segundo os interesses de mercado, do lucro, da competição e exclusão da maioria. Esta política não pode vingar no serviço público, sob pena de, aos poucos, conseguir destruir completamente a educação pública.

Um forte abraço,

Euler

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