sexta-feira, 19 de junho de 2015

Uma solução negociada para as ocupações de Izidora será o desafio de Pimentel, se não quiser deixar uma marca negativa para o seu governo


Atualização dia 22/06/2015: Felizmente, a reintegração de posse na Izidora foi suspensa, pelo menos para os próximos 15 dias. Uma nova rodada de negociação com os moradores foi aberta. É o que as lideranças do movimento pediam: querem discutir mais a proposta do governo e apresentar uma contraproposta, que atenda a todos. Parabéns a Frei Gilvander, pela incansável luta em favor dos de baixo. Parabéns também aos moradores das ocupações e suas lideranças, que, organizados, querem dialogar e conquistar um direito que deveria ser comum a todos os cidadãos: o da moradia digna. Parabéns à Igreja Católica, que se posicionou em favor da negociação, ao invés da violência. O governo de Minas, enfim, acabou concordando com este tempo para negociar. Esperamos que esta negociação resulte num acordo comum, amigável, que atenda a todos, especialmente aos moradores, que são a parte mais indefesa do processo. Como dissemos no texto abaixo, o problema da moradia é um problema social, e não de polícia. Os governos brasileiros das três esferas têm uma enorme dívida social com trabalhadores de baixa renda, pois não implementam políticas de moradia que atendam aos mais pobres. Mesmo uma política ousada como o Minha Casa Minha Vida, que construiu 3 milhões de habitações, não conseguiu alcançar uma parcela muito expressiva da população pobre, já que houve uma grande valorização imobiliária nas regiões metropolitanas, tornando impossível, para quem ganha até 3 salários mínimos, conseguir empréstimos para adquirir a sua casa própria. Tudo isso porque a política pública habitacional foi privatizada, ou seja, foi apropriada por grandes empreiteiras, que visam lucros, acima de tudo. Que essas empreiteiras ganhem dinheiro em grandes obras públicas, dá até para entender, mas em se tratando de moradia popular, era para se estabelecer outros critérios, que envolvessem a participação dos moradores, e uma ampla rede solidária que visasse baratear todos os custos de produção para que todos pudessem adquirir a sua casa. Vamos torcer, portanto, para que haja avanços nas negociações com os moradores da Izidora. E nada de polícia, Pimentel, que isso é coisa da época da ditadura.

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Uma solução negociada para as ocupações da Izidora será o desafio de Pimentel, se não quiser deixar uma marca negativa para o seu governo

Estamos assistindo a um desfecho trágico para as ocupações de Izidora, que fica na região Norte de BH. São centenas de famílias que formaram três ocupações – Rosa Leão, Esperança e Vitória -, que resistem há dois anos às diversas tentativas de desalojamento. Pelo que pudemos ler das notas oficiais de parte a parte, houve, nos primeiros meses do atual governo de Minas, uma tentativa de negociação. O governo de Minas teria proposto construir com verba do Minha Casa Minha Vida algo próximo de 9 mil apartamentos de 43 m2. Os atuais moradores da região de Izidora teriam que abandonar as suas moradias e ficariam, segundo o governo, em área próxima, receberiam um kit de construção, até que os apartamentos fossem concluídos.

Por sua vez, os moradores das ocupações não consideram esta a melhor solução. Eles estão alojados em área maior do que os 43 m2, já teriam investido todas as suas economias na construção de suas casas, inclusive de alvenaria, e consideram que algo como a urbanização dos locais já ocupados atenderia melhor ao pleito dos moradores.

Quem conhece a região do conflito sabe que bem próximo daquelas áreas existem centenas de moradias que foram resultado de antigas ocupações. O próprio poder público, em outras épocas, praticamente despejava moradores de outras regiões naquele local, então de baixa valorização imobiliária. Hoje, contudo, a realidade é outra. A região foi atingida pela valorização imobiliária em função das políticas desenvolvidas nos governos tucanos, que priorizavam grandes obras, sem olhar as consequências para os moradores de baixa renda. O resultado disso é que hoje nenhum assalariado de baixa renda tem condição de comprar um lote ou uma casa própria.

Mesmo as políticas de moradia do governo federal, como o Minha Casa Minha Vida, não alcançam estes segmentos da população, uma vez que a maior parte dos empréstimos é controlada por empreiteiras que ganham muita grana com a construção de apartamentos de duvidosa qualidade. Hoje, um apartamento de 40 m2 está sendo vendido entre R$ 150 mil e R$ 200 mil, o que torna impossível para um trabalhador que receba até três salários mínimos adquirir o seu imóvel.

Como Minas Gerais não tem políticas de moradias, e isto já se arrasta há mais de uma década, acabou por gerar as condições que levaram centenas de cidadãos a ocuparem áreas ociosas nas periferias dos grandes centros urbanos.

Ao transferir este importante problema social da moradia própria para o mercado, como tem acontecido nos últimos anos, os governos praticamente não deixaram outra opção para os cidadãos de baixa renda, que não fosse a de morar na casa de parentes; ou enfrentar aluguéis cada vez mais caros; ou, no limite, viverem nas ruas.

Frente a esta realidade, várias ocupações surgiram nos últimos anos em BH e nas diversas capitais do Brasil. É uma expressão da ausência de políticas públicas de moradias populares por parte dos governos das diversas esferas. Para solucionar este problema social, e não de polícia, os governos precisam dialogar com os moradores dessas ocupações. Procurar soluções de consenso que atendam às demandas dos moradores e também às de outros milhares de cidadãos que ainda não têm sua casa própria.

O que não é aconselhável, e não é aceitável do ponto de vista moral e ético, é tratar a questão das ocupações como caso de polícia. Pois, trata-se da vida de centenas, talvez milhares de pessoas, incluindo idosos, crianças, pessoas enfermas, e que certamente causará um profundo trauma na vida dessas pessoas e de tantas outras no entorno dessas ocupações.

Se é fato que as normas constitucionais asseguram o direito à propriedade, que fundamenta a reintegração de posse, não é menos verdade que esta mesma constituição assegura aos cidadãos o direito à moradia digna, e a necessidade de que a terra cumpra sua função social. Mas, na prática, uma canetada judicial pode decidir a vida de milhares de pessoas, para atender às vezes a um grupo econômico forte, que não carece de materiais básicos de sobrevivência humana, como é o caso da maioria dos moradores das ocupações Brasil afora.

Contudo, se um juiz pode tomar decisões a seu critério – digo a seu (dele) critério, porque a legislação permite que decisões opostas sejam tomadas com fundamentação jurídica -, logo, a decisão do juiz, nesses casos, é pessoal, de acordo com as suas convicções ideológicas, embora acompanhada de todo embasamento jurídico formal.

Cabe aos governos, que são eleitos pelo povo, agirem de forma mais moderada, buscando soluções negociadas sempre como primazia em relação à força bruta, que nunca resolve um problema social. 

Reparemos que nem mesmo os governos tucanos, nos últimos 12 anos, tiveram coragem de promover uma política de desocupação forçada contra as maiores ocupações de BH e Região Metropolitana. Não que eles não fossem a favor desta desocupação, mas porque compreenderam que o desgaste político seria muito grande, até mesmo para um governo tucano, useiro e vezeiro em políticas de choque contra os interesses populares.

Causa estranheza, portanto, que o governador Pimentel, do PT, logo nos primeiros meses do seu mandato, promova remoção forçada de três grandes ocupações na região de Izidora. Quando seria mais próprio do seu estilo que ocorressem exaustivas negociações, até encontrarem as melhores soluções políticas para o problema social em questão.

Vamos aguardar e torcer para que neste final de semana as lideranças dos movimentos sociais de ocupação e os governos do estado e do município encontrem uma solução mais adequada do que um desalojamento policial. Um bom acordo é sempre melhor do que uma saída forçada, que além de não resolver o problema, pode criar outros ainda maiores.


Um forte abraço a todos e força na luta! Até a nossa vitória!

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Frei Gilvander:

Convocamos todas as pessoas de boa vontade a participarem da Rede de Apoio às Ocupações da Izidora, em Belo Horizonte e Santa Luzia, MG.

Convidamos todos os professores a participarem. Tem uma conversa boa do Focault com o Deleuze, na qual um deles fala que a teoria é uma caixa de ferramentas. Boa hora de utilizá-las.

Convite estendido a todos profissionais, formados em algum lugar ou autodidatas. Médicos, advogados, faxineiras, motoristas, camelôs, empresários, desempregados. A cidade é nossa. Sindicalistas, lembrem-se de quantas vezes somaram nas suas movimentações apoiadores de outras partes.

É uma luta por um pedaço de terra. Não é uma luta por um pedaço de terra. É uma luta por um país mais justo. É a divisão do bolo que cresce desde sempre e para nós ficavam apenas as migalhas. São várias lutas nessa e não há separação entre elas.

É a política além do voto, a possibilidade de influenciar na história, que pode e deve ser escrita pela maioria. Sabe? Tornar a indignação concreta. Materialização estratégica da revolta em poder transformador.

Conecte-se, apareça, colabore. Seja a diferença. Experimente um tipo diferente de trabalho, no qual se recebe um pagamento jamais experimentando. Um trabalho vivo.

Sejam bem vindas(os) todos(as) rebeldes dessa cidade e de outras!

Resistiremos juntos. Contribua atuando coletivamente. Não vamos deixar que o trator do capital destrua as 5.000 casas da Izidora e que a dignidade de milhares de famílias seja respeitada.

Abraço na luta. Frei Gilvander Moreira

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Igreja Católica está com as Ocupações da Izidora

Passei mensagem para o arcebispo da arquidiocese de Belo Horizonte, Dom Walmor de Oliveira, pedindo que ele interceda junto ao Governador de MG, Fernando Pimentel, exigindo a suspensão dos despejos das Ocupações da Izidora e a reabertura de negociações com as Ocupações da Izidora a partir de Contraproposta Popular e Plural que estamos escrevendo. Dom Walmor me respondeu: "Frei Gilvander, bênçãos e condolências fraternas pela morte de sua mamãe Leontina. Conversaremos com as instâncias governamentais buscando o bem do povo. Em Cristo, Dom Walmor."


Abraço na luta. Frei Gilvander Moreira


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