segunda-feira, 23 de abril de 2018

Com canalhas no comando do país, Brasil caminha para o fascismo. Num misto de ditadura de toga com repressão policial


Com canalhas no comando do país, Brasil caminha para o fascismo. Num misto de ditadura de toga com repressão policial.

A elite brasileira é colonialista. Branca, preconceituosa, golpista, mau caráter e canalha. Nunca conviveu com a democracia. Mesmo a democracia formal, que concede direitos e garantias apenas no papel, enquanto na prática assegura ao clube fechado de privilegiados todos os direitos e blindagens. Esta elite está, desde sempre, associada ao que há de pior no cenário internacional. Antes, como agora. Se depender dessa elite o Brasil será sempre uma colônia, com um povo escravizado e uma casta com privilégios os mais variados.

O cenário político atual é o retrato deste preâmbulo que descrevi. O maior líder popular do país está preso sem ter cometido crime algum, sem prova concreta alguma contra ele, num claro processo montado pela CIA e pelos representantes no Brasil do Departamento de Estado dos EUA, tendo como executores dessa montagem a Rede Globo e suas afiliadas informais regionais (Itatiaia, Band, e etc) e um judiciário autocrático, representado pelo juiz Moro e sua equipe de Dalagnois e policiais federais cooptados e treinados pelos EUA. Da primeira instância de Curitiba, que se tornou uma força tarefa comandada diretamente pelos EUA, passando pelo TRF4 - uma extensão dessa força-tarefa -, até a formação majoritária do STF, tudo foi feito para a execução da obra golpista. Obra esta que derrubou uma presidenta da República eleita por 54 milhões de brasileiros e brasileiras sem prova alguma contra ela, sem que ela tenha cometido crime algum, enquanto uma quadrilha inteira de canalhas, corruptos e ladrões foi colada no poder federal. Com a missão de aprovar o corte de direitos sociais, trabalhistas e políticos do nosso povo. Um golpe de Estado com aparência de legalidade, mas na essência, um golpe contra os interesses do nosso povo.

A ditadura de toga montada ardilosamente com este conjunto de equipamentos estatais e para-estatais reúne ainda um congresso nacional corrupto, pilantra e por isso mesmo facilmente chantageado pelo aparato judicial-repressivo: fazem o que eles mandam ou serão presos. Simples assim. Não derrubaram Dilma pelos seus defeitos – que aliás, foram muitos, infelizmente – mas pelas suas qualidades, pela sua honestidade, pelas suas ligações com a população mais pobre, ainda que, no segundo mandato, por total equívoco de avaliações políticas e maus conselheiros tenha cedido com excesso ao canto enganoso do tal mercado, que não passa de um bando de jogadores oportunistas e prontos para saquear as riquezas do país em qualquer época, mas principalmente em tempos de crise.

A população brasileira, coitada, foi bombardeada durante anos num processo de lavagem cerebral estudado meticulosamente por especialistas em manipular massas e explorar as fraquezas, os vícios, os ódios e os preconceitos que o próprio sistema de manipulação cria diariamente nos seus programas e novelas e jornais, aspas, e que alimenta o ódio na classe média e parcelas dos mais pobres. Ódio contra os nordestinos, contra negros, contra o PT, contra Lula, contra Dilma, contra os sindicatos, contra os movimentos sociais, contra os pobres das periferias, transformados pela mídia em bandidos cujas garantias constitucionais são rasgadas diariamente. Enquanto os verdadeiros beneficiários dessa trama são blindados e protegidos de qualquer ataque.

Somos um dos países mais ricos e mais desiguais socialmente falando. E o partido e sua liderança que ousou iniciar um processo lento e gradual de tentar mudar essa realidade foram transformados pela elite beneficiária dessa triste realidade num inimigo a ser massacrado, eliminado, desmoralizado publicamente. Como fizeram com Tiradentes, com Canudos, com os Malês, com os quilombos mais combativos do longo período colonial e com todas as lideranças populares comprometidas com o nosso povo. Derrubaram Jango, tentaram destruir a imagem de Brizola, de Getúlio, de Luis Carlos Prestes, de Carlos Marighella, de Marielle, de Dilma e de Lula, entre outros e outras, por mais diferentes tenham sido os ideais e as práticas desses personagens da história do povo brasileiro. Em comum, todos eles e elas foram perseguidos, executados ou derrubados por contrariarem os interesses dessa elite canalha e egoísta.

O caso Lula é exemplar, porque se trata de uma grande – a maior nos tempos atuais – liderança popular que governou o Brasil conciliando interesses, sem incentivar ódio de classe, sem sequer querer mexer nas estruturas de poder que mantêm nosso povo escravizado. E talvez por isso mesmo tenha sido vítima desse sistema. Lutou e conquistou parcela do poder conseguindo com isso importantes direitos e conquistas para o nosso povo mais pobre. Tirou 40 milhões de pessoas da miséria e da fome, mas não atacou de frente o poder das elites, a Rede Globo, os lucros dos bancos, a intocabilidade de um judiciário cretino e corrupto, entre outras estruturas viciadas e que privilegiam sempre os mesmos e seus grupos.

Nem assim o grande líder popular foi poupado por essa elite cínica, que não transige no momento de massacrar aqueles que contrariam minimamente os seus interesses. E conquistar direitos para os mais pobres é tido por essa elite como uma forma de agredir seus interesses, seus feudos, seus espaços, o que ela considera patrimônio somente dela e de seus associados (seus patrões, na verdade) externos. Ela (esta elite) não se importa de ser submissa, vira-lata, totalmente servil aos grupos imperialistas, mas em relação ao povo brasileiro ela quer tratar no chicote. Por isso Lula, que é a maior liderança desse povo, de origem proletária, está preso, sem prova, sem crime, sem nada. Lula só não foi ainda esquartejado e salgado em praça pública porque a elite ainda tem medo da reação popular. Mas, na escalada fascista que varre o Brasil e o mundo não duvido que isso aconteça. Com ele e com todos nós que estamos do lado de cá da trincheira.

Por isso é preciso resistir, exigir a libertação de Lula e a possibilidade dele se candidatar a presidência da república. E intensificar o processo de reflexão coletiva, de diálogo e organização dos de baixo para enfrentar esses grupos nos mais variados terrenos.

Um abraço a todos e força na luta, até a nossa vitória final. Porque somos a maioria e carregamos o país nas nossas costas e temos o direito e o dever até de lutar por nossos interesses comuns. De uma vida mais digna para todos, com mais democracia, inclusive na repartição das riquezas produzidas por todos, com maior solidariedade, com mais garantias constitucionais individuais e coletivas e menos poder para esses grupos estatais e para-estatais que não foram eleitos por ninguém e hoje dão as cartas para servir aos poderosos internos e externos.


Justiça da Casa Grande não é justiça

Justiça da Casa Grande não é justiça

Gilvander Moreira[1]

A prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, dia 7 de abril de 2018, é um acontecimento histórico diante do qual não há espaço para omissão ou pretensa neutralidade. Quem não se posicionar será arguido pela história como cúmplice. Mesmo sendo crítico da política de conciliação de classes, da inclusão pelo consumo, da manutenção da política econômica concentradora de riqueza e renda, sem fazer as reformas de base e de outras contradições que Lula, o PT e Dilma praticaram ao longo de 13 anos no governo federal (2013 a 2016), uno-me a todas as pessoas que têm senso de justiça para discordar da condenação e da prisão de Lula, sobretudo da prisão em segunda instância, antes do trânsito em julgado, o que ameaça a presunção de inocência e o direito à ampla defesa de toda pessoa.

Caso a barbárie que é o capitalismo não provoque um apocalipse final para a humanidade e para grande parte de todas as espécies vivas, ao estudar história, as futuras gerações perguntarão a nós, seus pais ou avós: “O que estava acontecendo no Brasil quando o ex-presidente Lula foi preso?” Se não tiverem sido cúmplices, os pais e avós terão que dizer aos filhos/as e netas/os que o contexto socio-econômico-político-cultural e religioso no qual se deu a prisão de Lula era de um país tremendamente desigual e há 518 anos reproduzindo relações sociais escravocratas do tipo Casa Grande versus senzala, dirão que se tratava da continuidade da colonização, agora sob a hipócrita argumentação  de Estado Democrático de Direito.

Dirão que em 2018, no Brasil, quem estava sendo preso e injustiçado não era apenas o Lula, pois o Brasil era uma sociedade capitalista não apenas exploradora da dignidade humana, mas superexploradora da dignidade humana e, pior, devastadora de todas as fontes de vida: envenenadora da mãe terra pelo uso indiscriminado de agrotóxico na agricultura empresarial, a do agronogócio; dizimadora das nascentes de água, dos córregos, rios e lençóis freáticos; devastadora de todos os biomas, que estão sendo tratorados para invadir os territórios das comunidades originárias e tradicionais – indígenas, quilombolas e camponeses dos mais diversos matizes. O capitalismo e os capitalistas, no Brasil – país que deveria ser do povo brasileiro -, reproduzindo uma das maiores concentrações fundiárias do mundo e, pior, crescente. Uma política econômica inviabilizando a realização de uma reforma agrária popular e deixando “a ver navios” 14 milhões de desempregados, com trabalho intermitente análogo à situação de escravidão. Sem controle do tráfico de drogas, mais de 70 mil jovens sendo assassinados anualmente (700 mil em 10 anos). Após o impeachment da presidenta Dilma, consumado em 31 de agosto de 2016, aconteceu sucessivamente um desmonte de direitos sociais das classes trabalhadora e camponesas, direitos conquistados à custa de muita organização e luta popular. Os direitos trabalhistas foram aniquilados por meio da chamada reforma trabalhista, que, na prática, foi aniquilamento da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Cerca de 50% do orçamento do governo sendo sequestrado para reproduzir e ampliar uma dívida pública que apenas em 2017 cresceu 14,3%, ultrapassando 3,5 trilhões de reais e podendo chegar a 100% do PIB em 2022, dívida que já devia, segundo a Constituição de 1988, ter sido auditada e demonstrada como “as veias abertas do Brasil”. Direito à saúde e à educação indo para os ares por meio do congelamento – melhor dizendo, amputação gradativa - de investimentos governamentais nas áreas sociais por 20 anos. A maioria do poder judiciário nitidamente demonstrando disparidade de tratamento ao lidar com crimes de empresários e políticos, os que sustentam o status quo das desigualdades sociais, muitos sendo abonados pelo braço jurídico do Estado.

Pesquisas científicas nos informam que o agronegócio está fazendo mais de 600 mil pessoas contraírem câncer a cada ano. Encarceramento de massas, em presídios superlotados: mais de 700 mil presos quase todos empobrecidos, negros e de periferia, entre os quais 40% são presos preventivamente, sem terem sido julgados ainda. Vários ministros do Governo Federal golpista, mais de 200 deputados federais e dezenas de senadores arrolados em crimes de corrupção sendo livrados das barras da justiça por meio de foro privilegiado, algo nojento que coloca mais de 30 mil pessoas inatingíveis pela justiça.

Ah! Os pais e avós não poderão esquecer que no Brasil, em 2018, o povo brasileiro – 206 milhões de pessoas – estava anestesiado pela imprensa midiática, grande latifúndio de poucas famílias oligárquicas. Essa mídia com imenso poder econômico e tecnológico disseminava a mentira, a criminalização dos movimentos populares e de quem aguerridamente defendia os direitos humanos. A ideologia dominante imperava sempre invertendo as relações sociais: afirmando os oprimidos como opressores e apresentando os opressores como se fossem oprimidos. Enfim, em uma sociedade capitalista com classes antagônicas, com uma elite controlando o Estado – poderes executivo, legislativo, judiciário – as terras, o capital financeiro e a mídia. Caso não tenham sido mortos antes do tempo, os pais e avós das próximas gerações deverão ainda dizer, por fidelidade à verdade, que vários políticos profissionais sobre os quais existem fartas provas de crimes – malas de dinheiro, áudios comprometedores etc. – continuam intocáveis e protegidos pelo poder judiciário. Uns, embora com provas contundentes,  não foram  punidos e nada recaíram sobre eles, mas  outros, condenados  sem provas. Nesse meio, muitas decisões judiciais foram tomadas para fortalecer o status quo capitalista, tal como o impeachment de Dilma Rousseff, sem prova de crime de responsabilidade. O congresso brasileiro destituiu Dilma como se no Brasil houvesse parlamentarismo por voto de desconfiança. Era apenas o começo de um golpe que se desdobrou na prisão de Lula e que seguirá até a classe trabalhadora e camponesa se rebelar massivamente.

Nesse contexto, para seguir fortalecendo o poderio da Casa Grande sobre as novas senzalas, tornou-se necessário, segundo a elite que comanda o Estado brasileiro, condenar sem prova e prender Lula. Cumpria-se, assim, justiça dos doutores da lei e de certos tipos de fariseus. Porém, o Evangelho de Mateus alerta: “Se a justiça de vocês não superar a justiça dos doutores da lei e dos fariseus, vocês não entrarão no reino dos céus” (Mateus 5, 20). Dom Angélico Sândalo, ao lado do Lula, poucas horas antes de ele se entregar para ser preso, pôs o dedo em uma das feridas: “No Brasil, a maior parte da imprensa está a serviço dos poderosos. Os pobres clamam por direitos e por respeito”.

Entretanto, a história demonstra que os vencedores não terão a última palavra e serão varridos da história. Segundo o livro de I Reis 21, na Bíblia, o rei Acab e a primeira dama Jezabel, em meados do século IX antes da era cristã, para roubar as pequenas propriedades dos camponeses da época, tal como Nabot, tiveram que difamar, criminalizar, mentir e engendrar falso julgamento e até matar camponeses, como Nabot, um pequeno agricultor. Mas surgiu, possuído pela ira santa, o profeta Elias para desmascarar a violência que tinha sido cometida. Os que mandaram prender e assassinar Jesus de Nazaré comemoraram, mas, após três dias, a partir de uma mulher, Maria Madalena, que muito amava Jesus, irradiou-se por todo o mundo a mensagem de ressurreição do projeto de fraternidade, justiça e paz para todos e, e entre todos e  tudo. Não podemos nos curvar diante da injustiça. Assim como há o direito de legítima defesa, também há o direito fundamental e o dever à desobediência civil até que triunfe a construção de uma sociedade justa, solidária, sem preconceitos, amorosa e sustentável ecologicamente. No momento, predominam os violentos, mas eles passarão, pois das trevas da injustiça está sendo gestada uma nova aurora, sob a inspiração de Marielle Franco, Margarida Alves, Irmã Dorothy, Chico Mendes e milhares de outros/as lutadores/ras do povo. Enfim, justiça da Casa Grande não é justiça, pois para ser justiça precisa ser a partir da ética e da alteridade muitas vezes violentada. Preparemos um futuro justo, pois as próximas gerações têm direito.

Belo Horizonte, 10/4/2018.

Abraço terno na luta.

Frei Gilvander Luís Moreira
gilvanderlm@gmail.com
www.freigilvander.blogspot.com.br
www.gilvander.org.br
face: Gilvander Moreira III