terça-feira, 29 de junho de 2010

Minas, oh Minas, que vergonha!


Acho que hoje foi a minha última ida este ano, pelo menos, nas galerias daquela que deveria ser a Casa do Povo. Me sinto melhor no pátio, ou na praça, ou nas ruas, ao lado das pessoas com as quais travo os mais belos combates cotidianos. Mas, nas galerias daquela casa, na última semana, presenciei e participei de gestos de grande e corajosa resistência.

Não foi surpresa para mim, que vivi 47 dias de greve ao lado de pessoas que eu vi crescer politicamente, vi alçar vôos mais altos, enxergando horizontes antes limitados pelas paredes da escola ou da casa. O suor do nosso corpo misturou-se ao pó das ruas de BH e de cada canto de Minas, formando uma argamassa em quantidades mil vezes maiores do que todo o concreto dos castelos e viadutos construídos nos últimos anos.

Nas galerias daquela Casa, estranha para nós, embora seja cantada aos quatro ventos como a Casa do Povo, eu vi e ouvi, um mar de gente gritando, cantando, dançando, formando olas, xingando, de pé, sem medo de olhar para as sombras, apontando para baixo e dizendo: "a maioria de vocês, que diz nos representar, toma bênção ao faraó e diz amém ao governante de plantão".

Pelo menos da minha parte, proclamo aqui, em alto e bom tom: vocês não me representam, não falem em meu nome, eu não lhes dou este direito!

Enquanto as horas se passavam, de uma enrolação sem fim por parte de parlamentares sem inspiração, movidos a negociatas e serviçais dos poderosos, nossos bravos guerreiros não se entregaram, não esmoreceram, não se renderam.

Ali, bem ali, do outro lado da galeria, uma voz de um combatente, sem microfone nem nada, salta potente da garganta de um colega, que declama: "Minas, oh Minas..." destacando a vergonha de ver de joelhos aqueles que prometeram representar com dignidade a população mineira. Quão diferente a fala espontânea do colega com aqueles discursos decorados e ocos dos políticos profissionais que servem aos poderosos.

Lembrei-me de quando, numa praça, em frente à rodoviária de BH, no comício das diretas-já, lá pelos anos de 1984, nos escombros de uma ditadura militar já quase morta, uma voz gritava nos microfones: "Mineiros, o primeiro compromisso de Minas, é com a liberdade". Frase bonita, mas oca, porque dita por quem, avô do faraó, não legou como prática a liberdade, o respeito aos servidores de baixa renda, aos assalariados, enfim.

E ali das galerias, ouvindo o combatente gritando: "Minas, oh Minas...", seguido de um poema que nasce da alma do lutador, senti que a nossa batalha produziu e inspirou uma gente diferente. Ou talvez tenha apenas despertado em cada um de nós aquele tesouro que estava guardado no mais íntimo da nossa alma.

No último encontro, ali nas galerias daquela casa estranha, que não é a nossa, ainda, haviam poucos educadores. A maioria dos combatentes estão guardando energia para os novos embates. Apenas alguns poucos, que vieram buscar as últimas sementes das épicas batalhas, lá estavam para testemunhar estes momentos finais de resistência.

Ao meu lado, uma senhora, policial civil, cercada por uma galeria praticamente toda tomada por outros policiais, estranhou a ousadia daquele pequeno número de educadores, valentes, intrépidos, incansáveis. Eles, aos montes, centenas, comportavam-se de forma ordeira, silentes; nós, uns poucos, ao contrário, colocávamos abaixo o prédio daquela casa estranha. A senhora chegou a me indagar: vocês não têm medo de falar estas coisas não, heim? Respondi secamente: Não, nenhum, nenhum. E continuamos a formar um coral de vozes a chamar pelo nome adequado aqueles que dizem nos representar, mas que lá estão para cumprir ordens do governador e do faraó. Gente sem personalidade, sem brilho, sem caráter, até.

Após a votação, saimos, todos nós, de cabeça erguida, com o sentimento misto de frustração, mas também de vitória. Nem tanto pelas questões salariais em si. Claro que elas são importantes. Mas, a vitória maior é a nossa vitória moral. Não nos deixamos enganar pelas mentiras e preservamos intacto o nosso espírito de luta, o nosso compromisso com a luta pela Edcuação de qualidade e por um cotidiano melhor. E um cotidiano melhor se constrói com gente melhor. Todo mundo que participou da nossa luta sabe o que estou dizendo. Acho que nessa altura, até quem se omitiu aprendeu alguma coisa.

Por isso, ali, das galerias onde talvez eu não pise mais este ano, celebrei cada momento de luta, de ternura, de medo e de coragem, de decepção e de esperança, que afinal prevaleceu. Num dado momento, alma generosa que tenho, tive até dó daquele punhado de gente que diz representar o povo - tirando aqueles da oposição que realmente cumprem este papel -, mas que não passam de um punhado de imbecis, ridículos e pau mandados. É a degeneração moral de um ser. E isso dá dó. Jamais gostaria de interpretar tal papel. Prefiro muito mais o meu minguado salário e minha labuta diária, onde posso encarar cada pessoa que passa por mim de cabeça erguida, olhar nos olhos e expressar o que sinto, sem rodeios, sem hipocrisia.

Todos estes momentos foram uma aula para todos nós. De coragem, de ousadia, de ternura, de ser... humano. Talvez ali se aplicasse aquela famosa passagem bíblica, quando Jesus, provocado, diz: "A César, o que é de César". Naquela casa estranha, que não é a nossa casa, e por não ser nossa, só poderíamos mesmo colher muito pouco, ou nada. Pelo menos por enquanto, aquela é a casa do governador e dos poderosos. Por isso é para eles que os ditos representantes do povo dão os seus votos. A nossa casa é aquela onde indivual ou coletivamente decidimos os rumos da nossa vida.

Ali, das galerias daquela casa estranha, eu vi tudo isso. E estando, meus colegas e eu, em casa alheia, nada mais podíamos fazer senão gritar, e gritar, e gritar: Minas, oh Minas, que vergonha!

Leiam também:

O artigo do colega Wladmir Coelho
" Tremei-vos deputados"

O Blog da Cris

O site oficial do Sind-UTE

6 comentários:

  1. Parabéns Euler, precisamos de mais pessoas assim.
    Acompanho seu blog e hoje tomei a liberdade de pegar uns recortes de seu texto para enviar aos adoradores do Faraó.
    Reginaldo

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  2. OI Euler,
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  3. João Paulo Ferreira de Assis30 de junho de 2010 às 02:44

    Professor Euler,desculpe falar fora do assunto, mas acabo de receber a péssima notícia de que o meu partido o PDT, vai apoiar Anastasia. Comigo eles não precisam de contar. Irei pedir votos para Hélio Costa. Se eles me obrigarem a subir no palanque do nosso carrasco, sou louco o bastante de fazer igual um vereador aqui de Ressaquinha fez, desatentamente. Direi: ''gente, não vote no 45 não, vote no 15''. Imagine fazendo isso na frente do Anastasia. Seria muito divertido. O candidato a vereador em 2004 disse: ''gente, não vote no 17 não, vote no 14''. Ele fez isso na frente do próprio candidato a prefeito do partido dele, o 17 do PSL.
    Penso que não é só nós que temos de fazer a caveira do Anastasia. Talvez seja uma boa, aproveitar a insatisfação dos policiais civis.

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  4. Euler, porque este projeto foi aceito ?Não poderíamos ter resistido para que não perdêssemos nossos direitos adquiridos?Se a maioria não aceita o subsidio porque foi aprovado com tanta rapidez algo que prejudica os servidores antigos?Na mesma sessão o subsidio para policiais civis não foi aprovado.Quem disse sim para o subsidio?

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  5. João Paulo Ferreira de Assis30 de junho de 2010 às 11:10

    Cabe a nós agora dar a resposta nas urnas. Mas devemos ter muito cuidado, pois nossa luta inclusive está contra os prefeitos que se venderam ao Anastasia. No blog Minas em pauta, falou-se de uma pesquisa nova, em que Anastasia só está dez pontos atrás de Hélio Costa. Meu próprio partido o PDT aderiu a eles. Vou trabalhar para o Hélio Costa. Eu escrevi isso mesmo no blog Minas em pauta, e só depois de ter colocado é que fui ver que era o blog do Aécio... Meu comentário foi censurado, como era de se esperar.

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  6. Olá, pessoal da luta, um abraço fraterno em todos/todas!

    João Paulo, vc tem todo o direito de não seguir o seu partido em Minas, pois nacionalmente, pelo que sei, o PDT está fechado com Dilma, e não com Serra.

    Rosa, resistimos o máximo, mas, não temos ainda controle sobre a máquina do estado, incluindo legislativo, judiciário e executivo. A pressa em aprovar o projeto se deve ao calendário eleitoral. A antiga carreira ainda continua coexistindo com a nova. Vamos ter que lutar muito ano que vem para arrancar pelo menos em parte os direitos que o atual governo nos tirou. Mas, apesar de tudo, houve conquistas, como o aumento nos salários para janeiro de 2011 (coisa que não aconteceria sem a nossa luta) e o reajuste anual assegurado em lei.

    Dinha, os adicionais não incorporados são aqueles previstos na constituição, como 13º e 1/3 de férias, entre outros. Os demais foram incorporados no subsídio.

    Reginaldo, obrigado pelas palavras. Fique a vontade para copiar ou distribuir os textos deste blog.

    Um abraço a todos e obrigado pela visita.

    Euler

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